terça-feira, 3 de maio de 2011

Filme RIO - Só a educação dá asas

Além de ser um filme de animação excelente, trata, através da Arara-Azul Blu, um problema ecológico histórico no Brasil, o tráfico de animais.
Publiquei artigo no Caderno de Cultura da Zero Hora, de 16/04/2011, p. 6, comentando esse aspecto do filme. 

Só a educação dá asas


Rio, idealizado e dirigido pelo brasileiro Carlos Saldanha, é mais do que um excelente longa de animação com diversão garantida para todos os públicos. Além de mostrar a exuberância da Cidade Maravilhosa em imagens de tirar o fôlego, trata de um problema ambiental histórico do país, o tráfico de animais, uma das razões porque muitas espécies correm risco de extinção.

        A trama de Rio foi inspirada em um caso real, noticiado pelo Jornal da Globo, em 2002. Um espécime de arara-azul foi trazido de Tenerife, nas Ilhas Canárias, para uma reprodução em cativeiro no Brasil. No filme, o personagem principal, Blu, por causa do tráfico, vai parar em Minnesota, no norte dos Estados Unidos, onde por acidente é encontrado por Linda, menina que o protege e trata como se fosse humano. Depois de 15 anos de uma relação de intensa amizade, Blu descobre que é a última arara-azul macho do planeta e vem com a dona para o Brasil conhecer Jade, a última fêmea, na tentativa de salvar a espécie da extinção com uma reprodução em cativeiro. O problema é que integrantes do tráfico, sabendo do encontro entre as aves, resolvem capturá-las para vender no mercado negro.
         A beleza das aves brasileiras, com suas magníficas cores e plumagens, retratadas no filme com perfeição, foi objeto de desejo no final do século XIX, início do XX para a fabricação de acessórios femininos, como chapéus de plumas e penas, considerados sinônimo de elegância na Europa e em vários países da América. Naquela época, as exportações de penas eram legais e somavam toneladas, no entanto, representavam uma pequena fração dos números reais. Estima-se que, em regiões remotas do país, onde não havia fiscalização, o volume contrabandeado superava muito o divulgado oficialmente.
      As espécies mais cobiçadas eram, além de araras (por suas variadas cores), emas, garças, papagaios, periquitos, tucanos, beija-flores, e saracuras. Para se ter uma ideia da extensão da matança, é preciso considerar que, como cada ave contribuía com algumas gramas de penas, para se obter quilos ou toneladas, uma quantidade imensa de pássaros morria.
           Esse verdadeiro massacre foi denunciado por cientistas atuantes na época, como Emílio Goeldi, Herman Von Ihering e Edgar Roquette-Pinto. Hoje, felizmente, a legislação (Lei 9.605/98) estabelece que o comércio e transporte de animais silvestres são crimes ambientais, mas isso não garante sua preservação. Além desse comércio nefasto, as aves são perseguidas também para servirem como animais de estimação – o que ocorre por acaso, no filme.  As araras-azuis fazem parte da família psittacidae, a mesma dos papagaios, e são objeto de desejo por sua inteligência, docilidade, beleza, e capacidade de imitar a voz humana. Essa moda de animais de estimação leva às mesmas consequências do tráfico, a ameaça de extinção.
     As araras-azuis podem viver até 100 anos e não se reproduzem facilmente. São monogâmicas, fiéis ao parceiro a vida toda, escolhem árvores antigas para construir o ninho, onde colocam 1 ou 2 ovos por ano. Enfrentam inúmeras adversidades e predadores naturais durante todo esse processo, que são agravadas pela ação humana. Além do comércio ilegal, o desmatamento para a agropecuária reduz, ano a ano, seu habitat.
         No entanto, no mesmo Brasil que explora, há um alento de proteção, o Projeto Arara Azul que, desde 1990, é um sucesso, no Pantanal, em Mato Grosso do Sul. Inicialmente ação solitária da bióloga Neiva Guedes, hoje apoiada por empresas e ONGs, foi capaz de elevar a população de 1500 para cerca de 5000 aves. Exemplos como esse representam uma vitória, já que nos anos 1980 a perspectiva era de extinção, porém a ameaça ainda existe. O caso das araras-azuis é representativo da necessidade de um desenvolvimento realmente sustentável, que seja aliado da conservação das espécies.
            

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